Esquecer de
tudo
As dores do mundo
Não quero saber
Quem fui
Mas sim quem sou”
Hyldon
Keith Harris tem 47 anos, é irlandês e atualmente mora em Fortaleza. Herdeiro da arte de cortar cabelo, assim como parentes de várias gerações, inclusive pai e mãe, não demorou muito a montar seu próprio salão depois de um tempo de adaptação na cidade da luz, onde foi se movendo entre novos amigos e formando uma extensa clientela. Adepto dos cuidados com seu corpo e sua mente, Harris está sempre às voltas com alguma atividade, como ioga, pilates, corrida, artes marciais, krav maga – essa uma de suas paixões -, entre outras. Para sentir-se bem e para cuidar do seu instrumento de trabalho, ele mesmo! Tais hábitos revelam uma pessoa que tem gosto pelo autocuidado e pelo autoconhecimento, assim como indica, em seu caso, a incidência de dores pelo corpo. Algumas dessas atividades entraram na sua vida justamente como uma forma de tratar tais dores, que lhe acompanham desde quando era bem jovem, chegando a sentir-se incapacitado na fase mais vibrante da vida. Acometido de ler, bursite, crise lombar, tendinite, cogitava submeter-se à cirurgia quando sua namorada sugeriu-lhe ioga, que ele passou a praticar, além de acupuntura, shiatsu, fisioterapia, entre outras formas de tratamento. Mesmo assim, as dores não arrefeceram. Numa escala de 0 a 10, mantinham-se constantes e sempre na posição entre 6 e 7.
Não tem humor que aguente o assédio de tantas dores, por tanto tempo, além de comprometerem os movimentos físicos. A lista de mazelas de Keith parecia só aumentar. Não bastasse o que já carregava conscientemente, outros problemas foram detectados por um quiropraxista: escoliose ‘braba’, bico de papagaio... Começou a frequentar um osteopata, que “botava tudo no lugar”, para o seu alívio, porém, quando saia do consultório, na primeira esquina, seu esqueleto se deslocava para o estado das dores novamente. Estava para perder as esperanças numa vida melhor e, além disso, estava gastando uma fortuna! Melhorou com pilates clínico, porém aqueles incômodos voltavam indóceis.
A constância desses sintomas indesejáveis fez com que estes aparecessem frequentemente nas conversas entre amigos. Numa ocasião festiva, alguns deles indicaram-lhe a Técnica Alexander. Geórgia Dias, única especialista nessa técnica em Fortaleza, estava presente, explicou-lhe como funciona e, assim como o osteopata, sugeriu que parasse com todas as outras atividades por algum tempo durante as aulas, caso viesse a adotá-las. Keith viu-se num dilema: apaixonado por krav maga, estava ansioso por entrar numa fase mais avançada dessa luta de defesa pessoal, prestes a receber a faixa preta. Foram cinco anos e meio de investimento diário e nem cogitava a possibilidade de parar. Além do mais, depois de tanto tempo com dores e experimentando diversas terapias, precisava de ‘algo mais’ para embarcar numa nova e desconhecida aventura rumo ao seu bem estar.
Resistiu muito a ter que parar com as outras atividades, especialmente o krav maga, porém, com o quadro físico piorando, não teve escolha. O medo de, forçosamente, interromper seu projeto profissional - estava abrindo seu salão naquele momento – falou mais alto. Não podia colocar em risco o que dá sentido e sustento à sua vida. Venceram, então, a esperança de curar-se e livrar-se das dores, a curiosidade investigativa e a intuição de ter encontrado um bom caminho. Assim, além de ter se despedido, mesmo que temporariamente, de todas as outras atividades, embarcou em sessões diárias e em leituras sobre Frederick Mathias Alexander e sua criação. Incluiu a prática cotidiana de semisupina duas vezes ao dia, antes de sair de casa pela manhã e ao voltar à noite. Encantou-se com o mantra eu desejo o meu pescoço livre e seu o efeito imediato: “isso realmente funciona porque você está mandando mensagem para o seu corpo” e ele obedece. Seguir as direções sem colapsar, pensar em up, caminhar para trás indo para frente... Seus pensamentos foram absorvendo um novo conceito de movimento, conduzindo sua estrutura física a mover-se numa dança sutil. Em dois meses, percebeu mudanças positivas em todo o corpo e no humor, e agora as dores oscilam entre 4 e 5, numa escala de 0 a 10. Para uma personalidade independente como a de Keith Harris, a autonomia mental e corporal que está adquirindo nesse processo é fundamental na decisão de permanecer praticando a Técnica Alexander.
Esse novo conhecimento tem influenciado sua atuação profissional com resultados visíveis, mesmo que – ainda - sutis. Percebe isso no momento mais importante da sua atividade, justamente a hora do corte do cabelo, quando ‘ajusta’ os dois lados da cabeça da sua cliente para ter uma visão mais apropriada para fazer o corte. Afora movimentar-se mais livremente nessa ação, sua nova forma de se posicionar influencia no resultado final do corte, que, segundo ele, fica melhor e mais viçoso. Outra experiência muito importante e prazerosa no salão - que recebe muitos jovens interessados em aprender seu ofício - tem sido aplicar os exercícios e os princípios da Técnica Alexander nas instruções aos seus ajudantes e alunos. Ensinar a partir dos tais princípios tem sido como adotar uma nova e revolucionária pedagogia, ressignificando, assim, mais esse aspecto da sua forma de trabalhar e de mover-se entre uma ação e outra. Por tudo isso, Keith Harris voltou a escancarar o sorriso esquecido entre dores - inclusive a dor de deixar de praticar krav maga.