sábado, 12 de novembro de 2016

A dança do pescoço livre



“Eu desejo o meu pescoço livre para que minha cabeça possa ir para frente e para o alto permitindo que minha coluna se alongue e se alargue”
Desde que a conheço, a voz de Geórgia Dias entoa incansavelmente o mantra: “pescoço livre...”.  Não é difícil imaginar que tensões deixem de existir se o pescoço estiver livre. Sabemos, sem precisar investigar muito, que um número bem significativo de pessoas sofre com tensões que se traduzem em dores na região que vai do pescoço, passando pelos ombros, se expandindo para o torso. Problemas comuns que atingem pessoas sedentárias e também muitas que fazem atividades físicas constantes, atletas e até praticantes de outras modalidades de exercícios ou métodos e técnicas que existem para ajudar na melhoria dos corpos e seus donos, suas mentes, seus desempenhos, mas que, dependendo da forma como se pratica cada uma dessas atividades, ou, por outra, se o uso que cada um faz de si mesmo enquanto realiza tais atividades não for adequado, não estiver em equilíbrio dinâmico, pode ocorrer justamente o oposto, ou seja, o indivíduo pode ter seu desempenho comprometido. É a qualidade da relação entre cabeça, pescoço e torso que pode premiá-lo com bem estar físico e mental.
Trata-se do Controle Primordial, a segunda descoberta de Frederick Mathias Alexander. O Controle Primordial é a descoberta “de que a relação dinâmica entre a cabeça, o pescoço e o torso constitui o fator fundamental da organização do movimento humano”.  À frente, a cabeça inicia o movimento, e o corpo segue. Alexander começara a investigar o funcionamento do seu corpo devido à reincidência constante de problemas de garganta. Embora fosse ator famoso por costumeiramente ter bom desempenho, via-se frequentemente em apuros com rouquidão e até afonia. Ao tornar esses problemas objetos de estudo, descobriu que eles variavam de acordo com o uso que fazia de si mesmo, chave para a sua cura, fundamento da sua técnica.
“Alexander descobriu, antes de tudo, que a relação entre sua cabeça e seu pescoço tinha consequências imediatas para as condições de sua laringe e mecanismos respiratórios, e que, além disso, o Uso de sua cabeça e pescoço era fator primordial para a coordenação do Uso do restante de seu organismo. Seu desempenho melhorava quando alongava sua estatura, e isso ocorria quando ele usava sua cabeça da forma que descreveu como sendo “para frente e para cima”, em relação ao torso e ao pescoço.”
Geórgia Dias costuma sugerir aos seus alunos a imagem da nuvem no pescoço para levar à sensação de pescoço livre.  Eu mesma tenho repetido o tal mantra diariamente há mais de seis meses e só agora é que tive minha primeira experiência consciente de estar, de fato, com o pescoço livre. Caminhando na rua, de repente senti como se minha cabeça fosse uma gangorra movendo-se livre, feito pêndulo, sobre o atlas. Uma indescritível sensação de liberdade. Nessa dança do pescoço livre, as palavras repetidas pela professora ressonam com mais sentido, levando-me a usufruir melhor de seus significados na prática. “Pescoço livre é a chave para a liberdade total de movimentos”, diz ela.
Marta Aurélia é cantora e atriz. Tem formação em jornalismo e trabalhou por 30 anos em rádio, na emissora ligada a Universidade Federal do Ceará. Aluna de Técnica Alexander.

  1. Geórgia Dias começando a conduzir o grupo de estudos da Técnica Alexander enquanto os alunos estão em semisupina  – 08/10/2016 
  2. Gelb, Michael. O aprendizado do corpo – introdução à técnica de Alexander. P. 52. Martins Fontes. 1981.